Justiça afasta crime de descaminho a importadora acusada de omitir compradores
Por meio de uma decisão monocrática o ministro Sebastião Reis Júnior, da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não conheceu de um recurso do Ministério Público Federal (MPF) em um caso que reunia Direito Tributário e Direito Penal. O processo envolvia três representantes de uma empresa importadora, acusados pelos crimes de interposição fraudulenta na importação de bens, falsidade ideológica e descaminho.
Com o não conhecimento ficou mantida a decisão de 2ª instância, que absolveu os representantes. A empresa, representada pelos seus funcionários, foi acusada de ocultar os reais compradores de uma mercadoria. Eu sua defesa, porém, alegava que seu modelo de negócios era o de primeiro importar o bem, para depois contatar clientes interessados no produto – o que não caracterizaria o crimes apontados pela acusação.
A decisão data de abril, e o caso consta no sistema do STJ como enviado definitivamente ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), que julgou o caso. Segundo o relator na Corte, a análise do recurso pelo STJ envolveria reanálise de provas, o que é vedado pela súmula 7 do tribunal.
De acordo com Clarissa Höfling, sócia da Höfling Sociedade de Advogados e que atuou no caso, a decisão foi a última possível e sedimenta um entendimento importante. “O fato de existir uma empresa que se interesse pela mercadoria, antes da mercadoria ser importada, não a caracteriza como real importadora”, afirmou Clarissa. “Com isso o juiz absolveu os réus, a sentença foi mantida no TRF2, e agora confirmada no STJ”.
Conta e risco
A denúncia feita pelo MPF ao Poder Judiciário veio após a Receita Federal identificar diversas importações de componentes eletrônicos na modalidade por conta e risco próprios, quando a real empresa importadora seria outra – que compraria os bens.
Como a importadora se beneficiava do Fundo de Desenvolvimento de Atividades Portuárias (Fundap) do governo do Espírito Santo, haveria uma vantagem indevida, com implicações penais para os representantes, que passaram a responder pelos crimes de descaminho, formação de quadrilha e falsidade ideológica.
Em maio de 2016, o juiz Marcus Vinicius Figueiredo de Oliveira Costa julgou o caso em 1ª instância e absolveu os réus. Na decisão da 1ª Vara Federal Criminal do Espirito Santo, Oliveira Costa sintetizou o entendimento a favor dos acusados: “Não vislumbro fraude evidente, se, ao que parece, a empresa [trading] registrou as operações em nome próprio e inclusive recolheu os tributos incidentes, e ainda emitiu notas fiscais de entrada e de saída, para a empresa apontada como encomendante [a empresa] e também para outras”, pontuou.
O juiz de 1ª instância também fundamentou sua decisão no artigo 116 do Código Tributário Nacional. O dispositivo trata do poder da autoridade fiscalizatória de desconsiderar negócios jurídicos como o praticado pela trading. “Negar ao particular a possibilidade de escolher o caminho legal que lhe é mais favorável representaria visível intromissão do Estado na disponibilidade de entes privados que atuam em um sistema capitalista”, salientou o magistrado.
O MPF recorreu da decisão ao TRF2, onde o caso foi julgado em março de 2018. O relator do caso na 2ª Turma Especializada, desembargador Messod Azulay Neto, entendeu que a decisão tomada na primeira instância deveria ser revista, uma vez que houve uma conduta típica do crime de descaminho, previsto no artigo 334, caput, do Código Penal. Seu voto foi por aplicar condenação de dois anos e 11 meses de reclusão aos acusados.
Autora de voto revisor, a desembargadora Simone Schreiber divergiu e por fim, coube ao desembargador Marcello Granado garantir a maioria para absolver os acusados.
A conclusão vencedora é que a conduta praticada pelos então réus não caberia nas previsões do Código Penal. “Considero atípica a conduta narrada pelo Ministério Público Federal na inicial acusatória, impondo a manutenção da absolvição dos réus quanto ao crime do artigo 334, caput, do Código Penal”, apontou Simone, em seu voto.
O caso chegou ao STJ após o Ministério Público recorrer da decisão do TRF2. O Recurso Especial (REsp), em primeiro momento, não foi admitido pela Corte. A casa passou a analisar o caso apenas em Agravo em Recurso Especial (AREsp). Este agravo acabou não conhecido por Sebastião Reis Júnior, na decisão de abril deste ano.
Segundo Clarissa, que atuou no caso defendendo os acusados da empresa importadora e da compradora final do bem, apesar de o mérito da questão não ter sido discutido na 6ª Turma, a tese é nova na Corte superior. “Foram acusados apenas os representantes jurídicos das empresas, uma vez que a pessoa jurídica não responde a crimes deste tipo no Brasil”, complementou.
“O fato de existir uma empresa que se interesse por uma mercadoria, antes de ela ser importada, não significa que ela é a real importadora”, argumentou Clarissa. “Significa sim que houve uma análise de mercado, antes da importação da mercadoria, e houve quem se interessasse [pelo produto].’
Processo citado na matéria:
Na Justiça Federal do Espírito Santo (JFES) e no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2): 2011.50.01.005047-9
No STJ: AREsp nº 1.415.166/ES
Fonte: JOTA
Siga nossa página com dicas legais em comércio exterior e logística internacional.
Caso tenha dúvida, entre em contato por nosso WhatsApp ou agende uma reunião (clique aqui).
Sidnei Lostado, advogado
relacionamento@lostadocalomino.com.br